Garrett: Literatura, Política e Modernidade
Assinalando os 171 anos da sua morte, evocamos João Baptista da Silva Leitão de Almeida Garrett, figura maior do Romantismo português, cuja projeção ultrapassou a literatura e marcou profundamente a vida política e cultural da primeira metade do século XIX.
Nascido a 4 de fevereiro de 1799, o 1.º Visconde de Almeida Garrett destacou-se pela sua versatilidade, explorando géneros diversos como poesia, teatro, romance, jornalismo e ensaio dramático. Títulos como "Viagens na Minha Terra", "Frei Luís de Sousa" ou "Camões" tornaram-se referências da literatura nacional. Essa experiência literária reforçou a sua notável capacidade oratória e argumentativa.
Não surpreende, por isso, que Garret tenha sido reconhecido como um dos oradores mais brilhantes das primeiras décadas da Monarquia Constitucional. O jornalismo e a proximidade do poder abriram-lhe caminho para uma carreira parlamentar, onde foi deputado, ministro e um defensor da liberdade de imprensa e da reforma teatral. A sua visão cultural consolidou-se com a fundação do Teatro Nacional D. Maria II.
Não obstante a relevância da sua produção literária e intervenção política, a imagem pública de Garret foi, em múltiplas ocasiões, eclipsada por anedotas – tanto depreciativas, como laudatórias – e por acusações de elitismo e vaidade. Ainda assim, a análise da sua trajetória revela uma figura multifacetada, cujo legado na literatura e na sociedade se mantém inquestionável, ainda que permeado pela controvérsia.
Tendo falecido em Lisboa a 9 de dezembro de 1854, Garrett recebeu sepultura [no Cemitério dos Prazeres]. A 9 de julho de 1902, um decreto determinou a transferência dos seus restos mortais para o Mosteiro dos Jerónimos. A translação viria a concretizar-se a 3 de maio de 1903, não obstante as dificuldades financeiras que acompanharam o processo.
Numa circular emitida a 5 de fevereiro de 1903, que aqui divulgamos, a Sociedade Literária Almeida Garrett solicitava contribuições para a nova sepultura, sublinhando a urgência da iniciativa. Referia que a data prevista para a transferência dos restos mortais do escritor e poeta se aproximava e, não tendo ainda a Câmara Municipal de Loures enviado o subsídio — aparentemente já votado para tão patriótico fim — pedia uma resposta breve.
A vida e obra de Almeida Garrett – articulando literatura e ação política – testemunham um ímpeto inovador. Entre a genialidade artística e o impulso reformador, Garrett afirmou-se como um dos pilares da cultura portuguesa, deixando uma marca duradoura que atravessa o tempo e continua a inspirar debates sobre identidade, liberdade e modernidade.
Em 1966, consagrando definitivamente a sua memória entre os grandes vultos da história portuguesa, os seus restos mortais foram transferidos para o Panteão Nacional.

CML – AML – Série Correspondência Recebida, 1903